O Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul, por meio da 4ª Promotoria de Justiça de Três Lagoas (MS), ingressou com Ação Civil Pública de Obrigação de Fazer e Pedido Declaratório, c/c Tutela Provisória de Urgência em Caráter Incidental em desfavor da Sociedade Beneficente do Hospital Nossa Senhora Auxiliadora, que negou o fornecimento de prontuários médicos, sob fundamento de necessidade de preservação do sigilo médico dos pacientes.

De acordo com os autos, tramitou na 4ª Promotoria de Justiça o Procedimento Administrativo para apurar eventual situação de risco em que a criança F. R. M. T., teve sua internação hospitalar interrompida de forma abrupta e irresponsável pela sua própria genitora, que a retirou dos cuidados do Hospital, mesmo com diagnóstico ainda não fechado, inclusive com suspeita de contágio por covid-19.

Segundo o relatório informativo produzido pelo Conselho Tutelar do Município, o órgão teria sido acionado por membro da equipe de enfermagem do Hospital, alertando para o fato de que os genitores da criança a teriam retirado do local sem qualquer autorização da equipe médica, e sem aguardar os resultados dos exames. A criança padecia de grave pneumonia, e estava internada desde a semana anterior, sem percalços até a data de 18 de junho de 2020, quando então começaram os desentendimentos entre a mãe e os componentes do corpo clínico, que resultaram na retirada irresponsável da criança dos cuidados médicos.

Devido à situação e visando empreender medidas colaborativas para a resolução do problema, o MPMS oficiou a Direção do Hospital Nossa Senhora Auxiliadora solicitando cópia do prontuário médico da criança, bem como informações sobre o desfecho dos exames diagnósticos da covid-19 até então feitos. No entanto, o Hospital colocou sigilo médico e negou o fornecimento do prontuário, indo contra as providências necessárias a resguardar os direitos fundamentais da menor.

Embora o Hospital tenha ao final cedido parte da documentação requisitada, apontou a suposta existência de obstáculos de ordem jurídica para compartilhamento das informações, bem como solicitou que requisições seguintes fossem apresentadas juntamente com autorização expressa do paciente, o que não se sustenta face o acervo legislativo e entendimento jurisprudencial.

Nesse sentido, o Ministério Público Estadual expediu uma Recomendação informando que o posicionamento do Hospital poderia resultar em tomada de medidas cabíveis, previstas no artigo 10, da Lei 7.347/73 e art. 11, inciso II, da Lei de Improbidade Administrativa.

Em resposta, a Direção do Hospital informou que realizaria consulta perante o CRM-MS (Conselho Regional de Medicina), a fim de sanar os entraves sobre o fornecimento de prontuários médicos aos órgãos públicos, incluindo o Ministério Público Estadual. Pouco depois, apresentou o Parecer nº 46/2020, o qual, com base na Resolução CFM nº 1605/2000, haveria vedação em conceder cópia de prontuário médico a pessoa não autorizada pelo paciente, sendo que o art. 3º do referido ato normativo, inclusive, impediria a revelação de segredo que possa eximir o paciente de processo criminal. Ademais, as informações contidas no prontuário estariam protegidas pelo sigilo médico, a teor do art. 73 do Código Ética Médica, art. 154 do Código Penal e art. 5º, X, da Constituição Federal de 1988.

De acordo com o Parquet, toda a fundamentação do Hospital não é juridicamente idônea para impedir o fornecimento da informação, uma vez que o sigilo médico foi instituído em favor do paciente, sendo este paciente, justamente, a quem se pretende resguardar através da atuação ministerial.

Diante do impasse, o MPMS pede a concessão liminar para fins de impor ao Hospital Nossa Senhora Auxiliadora a obrigação de atender, no prazo de até 10 dias úteis, ou outro fixado nos atos requisitórios, todas as requisições ministeriais de prontuários médicos feitas no bojo de procedimentos regularmente instaurados no âmbito do Ministério Público de Mato Grosso do Sul e Polícia Judiciária, tendo por fulcro os dispositivos constitucionais e legais que conferem poder requisitório ao MPMS, independentemente de juntada de autorização expressa do paciente ou familiares por parte do Parquet e no ato de requisição que declare expressamente a não aplicabilidade do art. 5º, inciso II, da Lei Geral de Proteção de Dados, Lei 13.709/2019, como empecilho, inclusive quanto aos prontuários médicos requisitados em procedimento de índole extrapenal, ante a sistemática da própria legislação protetiva de dados pessoais.

O Ministério Público de MS requer a aplicação de pena de multa diária não inferior a R$ 10 mil por cada negativa de requisição ministerial, sem prejuízo das demais medidas cíveis e penais cabíveis e ainda, a designação de audiência de conciliação para que o Parquet prove os fatos alegados através de prova testemunhal, documental, e pericial.

Texto: Ana Paula Leite/Jornalista Assecom MPMS

Foto: Prefeitura de Três Lagoas

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