Com os votos mapeados, Deputados do Centrão e do PT vão retomar as conversas na próxima semana para tentar aprovar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que ameaça o poder de investigação do Ministério Público. Retirada de pauta anteontem, a proposta é uma das prioridades do Presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). A ideia é negociar alterações e, se for necessário, ceder em pontos polêmicos para angariar mais votos.
Com forte resistência de Procuradores e Promotores, a PEC altera as regras de composição do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), órgão responsável por fiscalizar a conduta dos integrantes do MP em todo o Brasil. Parlamentares contrários tentam suprimir ao menos dois pontos que consideram nocivos. Um deles estabelece que o Corregedor do colegiado só pode ser indicado pelo Congresso. O outro, na prática, pode conceder ao Conselho o poder de anular medidas de investigação. O texto permite a revisão de atos funcionais de integrantes do MP pelo Conselho, e tem sido considerado um retrocesso por integrantes do MP e especialistas.
Diante da falta de acordo para a votação, na tarde de anteontem, o líder do Governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), vocalizou a preocupação de parte dos Deputados. Em discurso enfático, argumentou que era preciso mandar um recado ao Ministério Público. Segundo ele, Procuradores atuam para constranger a classe política. Ao ser levantada a hipótese de que seria necessário negociar com o próprio MP, que exercera pressão sobre o tema, Barros rebateu:
— Projeto bom é projeto aprovado.
Sem maioria para garantir a aprovação, o Vice-Presidente da Câmara, Marcelo Ramos (PL-AM), no comandando da Casa, já que Lira está em viagem, decidiu adiar a apreciação da proposta para a semana que vem. São necessários ao menos 308 votos para aprovar uma PEC. Um requerimento de retirada de pauta deu o termômetro do apoio ao texto. Orientaram pela continuidade da votação partidos como PP, PL, PSD, MDB e até mesmo o PSDB, embora a bancada tucana estivesse dividida.
Perguntado pelo GLOBO se a PEC seria uma resposta da classe política ao MP, Barros respondeu:
— Eles (membros do MP) sabem que precisam de ajustes e que a mudança será bem-vinda. Conhecem melhor do que ninguém seus problemas internos.
Após a sessão, parlamentares disseram ao GLOBO que Lira acompanhava de perto, pelo telefone, os desdobramentos do plenário. O Presidente da Câmara estava em Roma, onde participou de evento preparatório da Conferência das Nação Unidas para o clima (COP).
Um dos Deputados relatou que o Presidente da Câmara ficou “na orelha” de Marcelo Ramos. O Vice da Câmara, porém, disse a interlocutores que só ligou duas vezes para Lira, e que acompanhar as votações, mesmo de longe, era praxe.
Posicionaram-se de forma contrária à votação partidos como PSL, PSB, PDT, Podemos, PSOL, Novo e Rede. Também houve pressão contrária da chamada bancada da bala, formada por congressistas ligados a forças de segurança, e que a partir da próxima semana também senta à mesa de negociação.
Em plenário, o PSDB, cuja bancada foi em parte convencida por Lira, esteve dividido. Procurador de São Paulo e Deputado Federal, Carlos Sampaio (PSDB-SP) considerou a proposta absurda. E criticou a tramitação a toque de caixa. A PEC foi aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) em maio. Depois, a Câmara formou uma comissão especial, mas o prazo das discussões se esgotou sem debate aprofundado. Ainda assim, Lira decidiu levar ao plenário.
— Foi inacreditável o que aconteceu. A Presidência da Câmara tentou aprovar de forma vergonhosa, sem que o assunto fosse debatido na comissão especial para este fim. Desconstituiu a comissão e tentou aprovar. É uma interferência absurda. Acaba com a independência do Ministério Público — queixou-se Sampaio.
Na mesma linha, o líder do Novo, Paulo Ganime (RJ), faz objeções à iniciativa. Ele entende que a interferência do Congresso no CNMP pode estimular a corrupção e servir de obstáculo a investigações:
— É colocar a raposa para cuidar do galinheiro.
Fonte: Bruno Góes/ O Globo